quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Mentira


Hoje eu menti pros meus alunos.
Primeiro me perguntaram se eu acredito em deus.

Contextualizando: periferia da periferia, último ano do Ensino Médio, noturno, a maioria trabalha o dia todo, quase dorme em sala de cansaço, vive numa pobreza absoluta. Deus pra eles é a única esperança.

Fiquei com medo de dizer que não acreditava. Era negar a vida deles.
Visto que sou professora de filosofia, eles esperavam que eu dissesse que não acreditava, mas iam pedir justificativas.

E justificar que você não acredita que aja algo que vá além do que seus olhos alcançam, que não existe nada que vá lhe salvar a hora que você não agüentar mais... Naquele contexto è no mínimo cruel.

Mas fazia tempo que não mentia sobre mim pros meus alunos. É ruim.

Mas vendo-os falarem de deus e suas peripécias, por um instante eu queria acreditar também, pra achar que a vida deles mudaria um dia, ainda que no paraíso celestial.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Imagens


Se partirmos do princípio que só existimos a partir da imagem que o outro formula sobre nós mesmos, fica bem difícil não nos importarmos demasiadamente com a forma que tal imagem está sendo construída.
Ora, ninguém quer uma imagem de si desfocada, desproporcional ou ainda alheia às suas expectativas.
E que imagem eu faço de mim mesma??? É óbvio que na maioria de nós, a imagem é bela, coerente e por vezes semiperfeita. Com explicações plausíveis para os detalhes sórdidos. Todos, minuciosamente justificados.

Porém todos contribuímos assiduamente para a formulação da nossa imagem no outro. Ora com sutilezas, conquistas, palavras, ideologias.

As ideologias são as que mais me incomodam. Pois estas constantemente estão anos luz além da realidade. Questiono por que é tão difícil firmar-se para além das convenções sociais ou ainda das atribuições e papéis nos impostos socialmente, sejam eles estéticos, comportamentais, sentimentais ou o diabo a quatro.

E preparamos nossos discursos, talvez os ensaiando frente aos espelhos, falando sozinhos enquanto dirigimos, antes de dormir, quando esperamos na fila do banco, na sala de espera do consultório médico. Ensaiamos sermos pessoas boas, conexas, fiéis ao outro.

Mas e a fidelidade à mim mesma, onde fica? E a fidelidade aos meus medos, aos meus desejos? Desejos que encontro também quando estou só, quando não tenho outros por perto. O que faço com ele?

Pra muitos é fácil elegê-los irracionais e, portanto botá-los numa caixa (de pandora?) e deixá-los adormecidos.

Creio ser uma questão fundamentalmente intima, logo, não me sinto no direito de julgar quais são os paradigmas que regem suas decisões.

No entanto muito me indigna o julgamento alheio às decisões, eleições de prioridades de outrem. Das pessoas que tentam ir além da convenção, ainda que pra isso paguem o preço de ter sua imagem turva, opaca, obscura: Da rainha Má!